Legalizar ou não a prostituição?
Entro no bar da universidade, faço o meu pedido e dirijo-me ao placard que disponibiliza postais gratuitamente, movida pela ânsia de somar mais alguns à minha colecção. Tudo parece normal até que encontro um postal assaz intrigante que reivindica a legalização da prostituição. Por escassos momentos, fiquei petrificada; depois, absorta nos meus pensamentos e, finalmente, murmurei para mim própria: “Só podem estar a brincar?”
Já em momentos anteriores tive a possibilidade de demonstrar a minha posição abolicionista sobre a prostituição, os seus actores e corolários. Porém, após a leitura de “Alugo o meu corpo”, da autoria de Paula Lee, e instigada pelo tal postalzinho (cujo remetente não consegui identificar), cedi aos meus impulsos opiniosos e deixei os meus dedos saciarem-se no teclado do pc.
Legalizar ou não a prostituição?
Eis uma questão complexa, mas em relação à qual a minha resposta é peremptória: NÃO! Não concebo a prostituição como uma actividade profissional porque não aceito a exploração sexual do ser humano; repudio o facto de alguém ser coagido a “alugar” o próprio corpo para (sobre)viver; recuso a coerção, submissão, violência, instrumentalização e criminalidade inerentes.
As vozes apologistas da legalização esgrimem argumentos como o de que a prostituição existe desde sempre. E depois? Há todo um conjunto de práticas e actos manifestos desde sempre e não é por esse facto que serão legalizados.
Enfatizam que a legalização melhoraria a vidas das pessoas que se prostituem, pois teriam exames médicos periódicos. Primeiramente, aquilo que se designa por “exames médicos” é apenas um mecanismo de controlo, equiparado à inspecção dos veículos automóveis. Depois, tendo em conta a experiência de outros países, grande parte dos prostitutos e prostitutas recusá-los-ia por temer o estigma social e a perda de anonimato. Este facto iria adensar a prostituição de rua.
Não tenho dúvida de que a legalização da prostituição possa beneficiar muitos actores do universo da prostituição, designadamente os proxenetas, máfias e redes de tráfico. Para estes, tornar-se-ia um negócio rentável apostar em agências de prostitutos e prostitutas. Apresentariam, em catálogos, todo o seu stock de carne humana com slogans do género “all sizes, for all styles”. Recorreriam aos anúncios de jornais para recrutar jovens porque, afinal, uma rapariga ou um rapaz de 16 anos (idade mínima para se começar a trabalhar) poderia prostituir-se. Imaginação não iria certamente escassear para garantir o sucesso de um negócio estribado na exploração sexual de seres humanos. Por isso, retenha-se: a legalização não controla a prostituição, mas tão-só a expande.
A prostituição não é um problema marginal; é um fenómeno claro e disperso que não pode ser ignorado e sonegado do debate público. Em Portugal, a prostituição está despenalizada, ou seja, apenas o proxeneta é criminalizado. Contudo, não creio que a criminalização do proxenetismo seja suficiente para diminuir a dimensão do fenómeno. Seguindo o exímio exemplo da Suécia, Portugal deve efectuar uma alteração à lei em vigência: criminalizar os clientes. Todavia, a criminalização do proxenetismo e dos clientes (Procura) não bastam para evitar que mulheres e homens enveredem pela prostituição. É necessário que as entidades policiais cumpram a legislação e punam os infractores, o que parece não se verificar. É necessária a optimização das estruturas social e económica deste país “à beira-mar abandonado”.
Anabela Santos
Etiquetas: Exploração sexual, Prostituição
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