http://www.makepovertyhistory.org O Mal da Indiferença: Nenhum respeito

sábado, setembro 08, 2007

Nenhum respeito

As escravas do sexo no Iraque contam as suas travessias
A família de Asma estava a atravessar sérios problemas financeiros quando um homem de sessenta anos apresentou ao pai uma proposta que não podia recusar: disse que queria contratar Asma por 200 dólares americanos mensais para que cuidasse da sua esposa deficiente.
Histórias dolorosas. A mãe de Asma era cega e o pai inválido, sempre na luta para poupar nas despesas. O homem assegurou que Asma poderia visitar os pais e que cresceria junto da sua filha. A família indigente aceitou a oferta mas Asma, com 17 anos, não tinha ideia do que a esperava. “O meu trabalho não se circunscrevia à cozinha; era obrigada a ter relações sexuais com o filho do homem que me contratou e com quatro ou cinco dos seus amigos”, conta depois de fugir de uma vida de escravatura sexual. “Deixei a casa do meu pai virgem e agora sou …”. Emudece. O seu pai não diz nada para além de “deposito a minha confiança em Deus”. A situação de segurança está a deteriorar-se e a ausência de leis permitiu que a escravatura sexual se expandisse no Iraque. Os traficantes podem vender as suas vítimas sem medo de serem punidos. Segundo a relação do Departamento de Estado dos EUA para o tráfico de pessoas, as meninas e as mulheres jovens provenientes de famílias pobres e incultas e os rapazes são obrigados a prostituírem-se; vendidos no Iraque e no estrangeiro em países como a Síria, Jordânia, Qatar, Emiratos Árabes, Turquia e Irão. Na mutável cidade do nordeste, Mosul, perto da fronteira com a Síria, as raparigas e as jovens que provêm de famílias indigentes e sem cultura, são particularmente vulneráveis à escravatura sexual.
Como escravas. Muitas delas, trabalhadoras domésticas, no fim tornam-se escravas do sexo. Khaled, 45 anos, admite prontamente o seu envolvimento no negócio sexual. Veste umas jeans e uma t-shirt amarela, quatro ou cinco anéis nos dedos e uma pulseira. Este repórter viu-a a discutir com um cliente sobre o facto se preferia uma escrava de cor ou branca. “Conheço algumas famílias que estão dispostas a serem mantidas pelas suas filhas”, disse. “Alguns perguntam-me se (as suas filhas) podem trabalhar exclusivamente na cozinha, enquanto outros fecham os olhos e dizem não ter ideia que as suas filhas são prostitutas”. Outras mulheres procuram Khaled por iniciativa própria mas nem sempre conhecem bem o seu trabalho. Zaineb, 20 anos, é uma jovem fascinante. Sentia-se responsável pelo sustento da sua família. O seu pai tinha sido preso pela polícia americana, a sua mãe estava doente e as suas irmãs menores precisavam de alguém para cuidar delas. Zaineb encontrou trabalho através de Khaled mas descobriu com horror que tinha entrado no túnel da prostituição. “Tenho de ter relações sexuais com diversos homens todas as noites”, conta Zaineb, que conseguiu contactar o Iwpr [Institute for War and Peace Reporting]. “O meu chefe e os seus amigos levam-me sempre para uma fábrica, embriagam-se e depois fazem sexo comigo. Choro, peço ajuda aos meus pais, mas quem pode ouvir-me?” As vítimas da escravatura sexual no Iraque têm pouca ajuda da polícia ou dos tribunais. A lei iraquiana pune exclusivamente o aproveitamento sexual de crianças.
Um pesadelo infinito. Muitas mulheres vêm para a escravatura no Iraque com a promessa de uma nova vida no Golfo. Khaled convenceu a família de Alia, 18 anos, de que um homem no Golfo estava ansioso por se casar com ela e comprou-lhe o passaporte e roupas novas. “Como qualquer outra noiva, estava feliz”, conta. “Mas depois de ter chegado ao Golfo, descobri que o noivo não passava de um gestor de um nightclub que levava muitas outras iraquianas para a prostituição. Consegui fugir depois de dez meses humilhantes. Gritava enquanto um deles fazia sexo comigo; tratavam-me como uma escrava que tinham comprado. Perdi os meus sonhos, esperanças e futuro”. O documento do Departamento de Estado revela que o Governo iraquiano não investigou nenhum caso este ano, não ofereceu protecção às vítimas ou fez algum esforço para prevenir ou documentar o tráfico. Indicou ainda os esforços necessários a tomar para evitar a cumplicidade dos oficiais públicos no Tráfico das mulheres iraquianas.
Sahar al-Haideri*
[*A jornalista que realizou a reportagem publicada, Sahar al-Haideri, trabalhava no ‘l’Institute for War and Peace Reporting a Mosul’ e foi assassinda em Julho de 2007.]
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