http://www.makepovertyhistory.org O Mal da Indiferença: Marcas e reflexos...

domingo, outubro 07, 2007

Marcas e reflexos...


Mulher. Divorciada depois de onze anos de tortura. Vítima de maus-tratos físicos e psicológicos por parte do seu marido, desde a primeira semana do casamento. Desempregada neste momento, mas não perdeu o sonho de ter um futuro melhor e de enveredar pelo ensino superior. O marido sempre a considerou uma incompetente, mostrando-lhe que ela não era capaz de fazer algo por si, por isso perdeu a esperança e a auto-estima. Entregou-se a uma vida destruída pelos sonhos de menina e a única recordação boa que guarda dos momentos de criança foi o facto de ter crescido numa família feliz. Desde muito nova foi incentivada à partilha e à igual distribuição das tarefas no espaço doméstico, mas o casamento trouxe o amargo sabor da “desunião”, da distribuição diferenciada das tarefas domésticas e da submissão a que estava sujeita diariamente. Depois de cada acto de violência, o marido tinha como hábito fechá-la dentro do quarto, para a tortura ser ainda maior. Esta é a história partilhada de uma mulher vítima de violência doméstica entre muitas outras.

Vejamos algumas das suas principais revelações:

1. Sempre foi vítima de maus tratos na sua família, após o casamento?
“Sim, vítima de agressões. Ele batia-me. Logo na primeira semana de casamento fui vítima de maus-tratos. Tentei impedir e sair de casa, só que por causa de ditos não fiz vergonhas. Os outros diziam que agora a minha vida era outra; que não podia ligar nada ao que muitos me aconselhavam e que agora tinha que obedecer era ao meu marido. Mas sempre pensei “mas eu não casei para ser o saco de boxe de ninguém”. Desde que comecei a namorar para ele, vivi na ilusão que ele era uma pessoa espectacular e uma pessoa que me vai fazer tudo na vida...E afinal não foi nada daquilo. Começou, logo, no inicio a mostrar tudo ao contrário. (...) Repare que verbalmente e psicologicamente ficava desgastada... Se ele dizia que “um pau era uma pedra, eu também dizia que era uma pedra”.


2. O meio familiar e o meio social em que estava inserida aceitaram de ânimo leve o facto de ser vítima de crime de violência?
"De ânimo leve não digo que aceitaram, porque me diziam que ele não parecia ser quem realmente demonstrou ser. Mas sempre fiquei na esperança que ele ia mudar e foi por isso que eu aguentei tanto drama. (...) Ninguém sabe quem vive debaixo do tecto é que sabe. (...) Omiti esta situação durante muito tempo e dei-lhe muitas oportunidades, mas ele nunca mudou."


3. Durante o namoro nunca teve sinais do seu comportamento desviante?
"Agora que eu olho para trás, nunca senti indícios de que ele era violento, violento talvez não, mas super ciumento era. (...) Já há muitos anos que olhava para ele e cada vez que olhava para ele parece que tinha uma borboleta no estômago ou aquela sensação de estar super apaixonada e passava-lhe tudo ao lado. (...) Agora olhando para trás, eu acho que ele estava a fazer pouco de mim."


4. O seu marido contribuia nas tarefas domésticas?
"Era eu. Ele não fazia nada. (...) “Tu sabes que eu não gosto de fazer isto, tu sabes que eu não gosto de fazer aquilo”. Mas não, não chegava à agressão, ele chegava a ignorar-me. Eu a pedir-lhe para ele me ajudar e ele dizia-me “tu é que és a mulher da casa, faz tu as coisas, isto não são coisas para homens”.


5. O que é que pensa sobre a violência doméstica?
"Sinto gana a quem o faça, porque acho que isso é diminuir a outra pessoa o máximo e o homem acaba por sentir-se maior e acaba por não ser assim. Ele acaba por adquirir a pior personalidade, a pior estatura. Acho quem o faz devia ser punido severamente."


6. Pensa que há uma relação entre a violência doméstica e o exercício do poder no interior da família?
"Eu acho que é por o marido sentir-se diminuido por a mulher ter mais estudos, pelo facto da mulher ter outra postura e ele como não a tem quer-se sentir superior a ela e é só assim que consegue, por ser o homem, o macho da casa."



"Eu não casei para ser o saco de boxe de ninguém"




Ana Ferreira

4 Comments:

Blogger cuscavel said...

Obrigada pela partilha!

PS: poderia dizê-lo em todos os (excelentes) posts, mas o ar "inalcançável" (como vos vejo, não como querem ser vistas, acho)não ajuda ao comentário. :)

22:52  
Anonymous Anónimo said...

Obrigada pela visita!
Contudo, uma questão me assalta: o que queres dizer exactamente com "ar inalcançável", que "não ajuda ao comentário"? beijos

11:22  
Blogger cuscavel said...

Aprendo sempre muito, quando cá venho, mas tenho a sensação de cá não estar ninguém, a não ser ideias. De resto, acho até que é o primeiro comentário que respondem...

bjinhos

02:02  
Anonymous Anónimo said...

Olá Cuscavel!

Quando publicamos um texto, o nosso intuito é sempre o de incitar ao debate. Contudo, este objectivo fica, por vezes, comprometido porque os visitantes raramente deixam o seu comentário. Contra isso, nada podemos fazer. Tentamos diversificar as temáticas e abordá-las de várias formas (séria, rigorosa ou anedoticamente), mas os visitantes não emitem a sua posição do modo como desejávamos :(

Procuramos actualizar o blogue o mais assiduamente possível, bem como responder a eventuais comentários que os visitantes possam deixar. Concluindo: nós tentamos lançar o discussão, não podemos coagir os visitantes a comentar e a preencher/avivar este espaço :(

beijos

11:12  

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